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Os Estados Unidos devem dar início ao mais importante julgamento de monopólio da era da internet.
O evento também é parte de uma série de confrontos recentes entre empresas multinacionais de tecnologia e o governo americano.
Quem está no banco dos reús dos tribunais federais de Washington desta vez é a gigante Google.
O processo deverá durar cerca de 10 semanas e algumas das figuras mais poderosas do setor serão ouvidas.
O juiz Amit P. Mehta, nomeado em 2014 pelo então presidente Barack Obama, será o responsável por proferir a sentença, embora o caso possa ainda receber recursos e parar na Suprema Corte dos EUA.
1. Do que a gigante de tecnologia é acusada
O Departamento de Justiça dos EUA acusa o Google de abusar de sua posição dominante nos serviços de busca pela internet.
A gigante da tecnologia é responsável por 90% desse serviço em terras americanas.
De acordo com o Departamento de Justiça, a empresa conseguiu e manteve essa fatia dominante do mercado de forma deliberada, por meio de acordos de distribuição anticompetitivos e excludentes, que padronizam as opções de pesquisa padrão em navegadores, telefones celulares, computadores e outros dispositivos.
O procurador do Departamento de Justiça, Kenneth Dintzer, encarregado de inaugurar os argumentos iniciais na terça-feira (12/9), afirmou que, para alcançar “essa posição privilegiada”, a empresa paga mais de US$ 10 bilhões por ano a fabricantes de dispositivos (como a Apple), a empresas de telecomunicações (como a AT&T) e a fabricantes de navegadores (como a Mozilla).
Além disso, Dintzer afirmou que o Google manipula leilões de anúncios online para aumentar os preços aos anunciantes.
“Há duas décadas, o Google se tornou o ‘queridinho’ do Vale do Silício como uma startup com uma forma inovadora de pesquisar na Internet. Mas esse Google desapareceu há muito tempo. O Google de hoje é um guardião monopolista da internet e uma das empresas mais ricas do planeta”, aponta a acusação original.
A ação exige que o Google seja considerado ilegal, que a empresa seja forçada a cessar suas supostas práticas de abuso de posição dominante e que sejam adotadas as “medidas estruturais necessárias” para reparar qualquer dano anticompetição.
Não está claro, porém, quais deveriam ser essas medidas.
A acusação também apela à adoção de “quaisquer outras medidas preliminares ou permanentes necessárias e apropriadas para restaurar as condições de concorrência nos mercados afetados pela conduta ilegal do Google”.
2. O que o Google diz e como deve se defender
Basicamente, a empresa acredita que está sendo punida pelo seu sucesso.
“O Google certamente não é o guardião da Internet”, argumentou o advogado-chefe da empresa, John E. Schmidtlein, na audiência de terça-feira (12/9).
Ele frisou que diferentes criadores de algoritmos de busca disputam para se tornar a ferramenta padrão da maioria dos dispositivos — o Google compete muito por essa posição e, se sai como vencedor, é “por méritos próprios”.
Além disso, “essa intensa concorrência apenas melhorou o desempenho e a qualidade dos navegadores, resultando numa maior utilização dos motores de busca”, acrescentou o advogado.
Os argumentos em que Schmidtlein e os outros representantes legais do grupo se apoiarão foram antecipados por Kent Walker, presidente de Assuntos Globais da Alphabet, empresa-mãe do Google, num post de blog intitulado “As pessoas usam o Google porque é útil. Nossa resposta ao EUA vs. Google”.
“Como dissemos desde o início, este processo é profundamente falho”, diz o texto.
“Planejamos demonstrar no tribunal que nossos acordos de distribuição de pesquisa refletem as escolhas dos navegadores e dos fabricantes de dispositivos com base na qualidade de nossos serviços e nas preferências do consumidor.”
“Facilitar a obtenção de produtos desejados pelas pessoas beneficia os consumidores e é apoiado pela lei antitruste dos EUA. Em suma, as pessoas usam o Google não porque precisam, mas porque querem.”
Walker ressalta que é fácil mudar o mecanismo de busca padrão do dispositivo, se assim desejado pelo usuário, e mostra isso com um vídeo incluído na postagem: basta dar dois cliques no navegador Safari no computador e quatro no iPhone, por exemplo.
Além disso, Walker destaca que os executivos da Apple disseram que escolheram o Google porque é “o melhor” e que o acordo da empresa com os navegadores não é exclusivo.
“Pagar fabricantes de dispositivos e operadoras para promover ainda mais serviços como o Chrome e o Search é semelhante a um supermercado cobrar de uma marca de cereal para exibir seus produtos em uma prateleira ou no final de um corredor.”
3. Quem deve testemunhar
Neste momento, o julgamento está marcado para durar dez semanas — e dezenas de testemunhas passarão pelo tribunal.
Sundar Pichai, CEO do Google e da Alphabet, deve ser um dos depoentes.
O nome dele já apareceu nas declarações iniciais de terça-feira (12/9), depois que Dintzer insistiu que o Google sabia que “os acordos ultrapassavam os limites antitruste”.
Após a argumentação inicial, o promotor mostrou uma conversa em que Pichai pede que o histórico de um determinado chat fosse desativado.
Da mesma forma, vários pesos-pesados da Apple deverão testemunhar no processo, como Eddy Cue, vice-presidente de Serviços; John Giannandrea, vice-presidente de Estratégia de Aprendizado de Máquina e Inteligência Artificial; e Adrian Perica, presidente de Desenvolvimento Corporativo.
No início deste mês, Cue, Giannandrea e Perica perderam um recurso para não serem convocados como testemunhas no julgamento.
Pichai já está em Washington, onde participa de um fórum global sobre inteligência artificial no Senado dos EUA.
Por que dizem que o futuro da Internet está em jogo
“Este caso tem a ver com o futuro da internet”, alertou o procurador Dintzer.
Ao entrar com a ação, o Departamento de Justiça dos EUA comparou o caso a outros julgamentos antitruste cujos resultados foram um marco.
Em 1974, o caso da AT&T levou à divisão da gigante telefônica uma década depois. Em 1998, a Microsoft foi condenada por abusar de sua posição dominante no mercado de computadores pessoais para impor o navegador Internet Explorer.
Neste último caso, o juiz decidiu inicialmente pela dissolução da Microsoft — mas, após interposição de recurso, o caso foi encerrado.
Seja como for, o desmembramento da AT&T em 1984 abriu caminho para a indústria moderna de telefonia móvel, enquanto o processo com a Microsoft é visto como pioneiro, ao abrir espaço para o Google e outras empresas na internet.
Este não é o primeiro nem o último dos processos judiciais que o Google enfrenta.
Em janeiro, o procurador-geral dos EUA, Merrick Garland, anunciou outro processo, desta vez por suposto abuso de posição dominante no mercado de publicidade digital.
Esse caso não deve ir a julgamento até pelo menos no próximo ano.
Na União Europeia, a gigante de tecnologia recebeu as três multas mais elevadas da história por práticas anticoncorrência.
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